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Por Ana Martha Wilson Maia
“Sozinhos e intoxicados” é o tema do II Colóquio TyA que será realizado em São Paulo, por ocasião do próximo Encontro Brasileiro do Campo Freudiano. Seguindo nesta direção, o Núcleo de Toxicomanias e Alcoolismo organizou o Programa de pesquisa para trabalhar em torno dos conceitos/termos de solidão, solitude e parceria.
Iniciamos com dois textos de Miquel Bassols, muito orientadores para delimitarmos o campo “conceitual” da solidão. No primeiro, Bassols (1994) lança a pergunta se podemos estabelecer uma clínica diferencial da solidão, a partir da neurose, da perversão e psicose. Deste texto, concluímos uma solidão generalizada para todo ser falante.
O segundo texto aborda a solidão na experiência de enclausuramento da monja Sor María, do Mosteiro de Santa Catalina, em Buenos Aires. María concedeu uma entrevista inédita a um colega da EOL que foi exibida durante as XXIV Jornadas Anuales da EOL do ano passado, cujo tema foi “Solos y solas”. Bassols (2015) esteve presente e publicou um texto do qual extraímos uma referência conceitual que contribui para pensarmos sobre a zona de extimidade do gozo do Outro, se este existisse, “mais além do falo e de seus véus”(Bassols), sobre “a solidão como meio” e a “certeza” (María), que nos levou a comentar sobre a certeza do gozo obtido pela droga.
Nas palavras de Bassols, “Há outra solidão que não é um meio, mas tampouco não é um fim. Ou, se me permitem dizê-lo assim, há uma solidão que é “um meio sem fim”, um meio infinito, um espaço de solidão que não tem bordas, nem limites.”
Que relação tem o ser falante com este modo de estar na solidão, intoxicado? – é uma das questões que formulamos. Pensando nas adições, sabemos que a sociedade contemporânea oferece múltiplas formas de parcerias e que as toxicomanias, assim como a virtualidade, são uma solidão de época.
Bassols estabelece três formas de abordagem da solidão: a solidão que se auto-abastece na esfera imaginária do eu consigo mesmo; a solidão que se abre ao Outro do simbólico (o sujeito está sozinho com a linguagem, acompanhado com o Outro da linguagem); e a solidão frente a uma falta real, uma solidão sem fim, em que o Outro tem a estrutura de um Toro. Ele diz: “ante o buraco do Outro, há uma solidão irredutível, é a solidão do gozo do Um, sem representação possível”. É a solidão do gozo acéfalo da pulsão sem Outro.
A solidão do gozo do Um é formalizada por Lacan a partir dos anos 70 e atualmente referencia o trabalho do Campo Freudiano sobre o corpo falante. Com o declínio do patriarcado, Lacan destaca a inexistência do Outro e o gozo do Um. A partir daí, podemos pensar a solidão estrutural pela via da relação sexual que não existe. O Um é homólogo à solidão estrutural. Assim, cada um faz uma coisa com esta solidão do Um para viver, o que nos traz a questão do destino que o toxicômano deu a seu gozo solitário.
Gozo do auto-erotismo. Solidão do Um. Autismo nativo. Estamos refinando os conceitos em nossa pesquisa, articulando-os à Teoria do Parceiro (2000), de Miller, como também ao curso El partenaire-síntoma (2008), tendo em vista a parceria do corpo falante com a droga.
BASSOLS, Miquel. (1994) Soledades y estruturas clínicas. Revista Freudiana – Lazos y soledades: toxicoman. ELP. Paidós, nº.12. 1994
BASSOLS, Miquel. (2015) Soledades II. Desescrits. Disponivel em http://miquelbassols.blogspot.com.br
Miller, J-A. Os circuitos do desejo na vida e na análise. Rio de Janeiro: Contra Capa. 2000.
Miller, J-A. El partenaire-síntoma. Buenos Aires: Paidós. 2008.
Pharmakon Digital. Rede TyA do Campo Freudiano. Edição 01. 2015